DO ELETRÔNICO AO ROMÂNTICO

 

ZILMAR WOLNEY AIRES FILHO*

 

08/12/2009

 

                   Eu preferiria o bafejo das manhãs, com o sol de primavera e o zumbido de abelha sobre as flores, ao bom dia metálico de MP3, TVs, celulares e computadores.

                   Eu preferiria recadinhos no criado do quarto, fixados na geladeira, em livros, cartas, beijos em guardanapos, aos torpedos, mensagens MSN, telejornais e os profissionais e técnicos e-mails.

                    Eu trocaria todos os orkuts, chats, salas de bate-papos, por uma tarde, sem fim, que arrebentasse madrugada à fora, em prosas e conversas, ainda que jogadas fora, por todos os botecos de esquina, de Manoel, Pedro ou Joaquim. 

                   Eu admitiria o regresso ao romântico conflito adolescente, de cinco contra um, sob o chuveiro, a título de preliminares e alongamento físico da caminhada para o afeto, sempre pensando na amada, à permanecer estático no sofá, em frente a TV, observando tantas outras, que criam encenações para tentarem demover a fidelidade da minha libido.

                   Eu preferiria o retorno ao romantismo feminino que apenas insinuava, através dos decotes, do batom, da minissaia, ao escroto e escrachado eletrônico que banaliza o sexo, mostrando o útero antes da mágica da sedução. Sem contar que privou o homem da peculiaridade histórica de sair à cassa, pois que agora, é cassado,  seduzido e conquistado, a um tempo só, por mulheres modernas, emancipadas com requintes eletrônicos.

                   Eu trocaria o melhor filme da sessão tal, pelo som do pinho e pela cor e luz do luar, naquele quintal, naquela varanda e naquele bar.

                   Eu dispensaria qualquer bronzeamento eletrônico de cá, pelo sol natural de lá, ainda que escamasse pele morta, por toda uma semana.  Assim como, permutaria banho de sauna, pelo banho de chuva, na estrada do piscinão da chácara Água Boa, onde apesar das minúsculas e imperceptíveis secreções humanas, inexistiriam as micoses das águas termas e eletrônicas de cá. 

                    Eu dispensaria todos os datas-shows e seus power-points, apenas por palavras, palestras, aulas regadas ao velho quadro negro e giz, por meio de uma oratória acompanhada por retórica de exemplos de vidas de cidadãos, não super-heróis, e fatos comuns e cotidianos. 

                   Eu preferiria os telefones fixos aos celulares que criaram inúmeras dependências e frustrações. Uma, porque quando você mais precisa dele, a bateria arria; outra, quando dá prego no carro, ele está fora de área. E, por fim, quando você imagina que ele vai servir, está sem crédito, e há um telefone fixo ao lado. Ou seja, é apenas uma coleira eletrônica, para violar a nossa vida privada, intimidade, ou para nos fazer vítimas de clonagem à indústria dos crimes organizados, ou para para nos tornar vulneráveis à cobranças indevi-das do cartel das telefônicas.

                   Eu preferiria que meus filhos usassem menos controles eletrônicos, e chutassem mais bolas. Soltassem mais pipas, andassem mais de bicicletas sentindo o vento no rosto antes que a luz das telas.

                   Eu preferiria a surpresa nos partos, e as mãos milagrosas de tantas “mães parteiras”, do que a comemoração eletrônica e antecipada do sexo dos bebês. Uma, porque não se falaria do aborto dos bebês anencefálicos; outra, porque não abriria a possibilidade de manipulação da genética, trazendo de volta a incoerência da raça ariana de Adolf Hitler. 

                   Eu preferiria o borralho do fogão à lenha, que é inesquecível, tanto pela dificuldade de granjear brasa, como pela sujeira do carvão, bem assim pelo insuperável sabor produzido nos assados. Talvez, por isso, seja compre-ensível, como, dia após dia, os microondas e fogões eletrônicos vêm sendo substituídos pela labareda das brasas.

                   O resgate dos sons de vozes e cordas, através dos acústicos, tem demonstrado a necessária e irreversível superação do metálico e eletrônico por práticas e condutas humanas e românticas.

                    O resgate à leitura de bons livros tem mostrado que nem tanto download, tem superado as visitas às bibliotecas e a aquisição de obras em livrarias e bancas de revistas e jornais.

                   O mundo eletrônico, e seus acessórios, encurtaram distâncias, auxiliando em pesquisas. Todavia, não podem, e não devem, derrogar hábitos e práticas comuns e saudáveis, que aproximavam e libertavam humanos. Pois, estes costumes foram consagrados, ao longo da existência, porque o homem é eminentemente coletivo, e como tal, deve continuar interagindo, pessoalmente, com os seus pares, ampliando, auxiliando, e dividindo conhecimentos.

                    O eletrônico não deve ser o arreio, a mordaça, o vilão do tempo dos humanos, mas, acima de tudo, o assessório que lhe possa servir de entreteni-mento, sem vício e dependência. Deve ser o apoio necessário a pesquisas e, de vez em quando, o mecanismo ágil para dividir reflexões, quem sabe, de romantismo e saudade!

 

* Professor Universitário e Advogado.

       

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