19/06/2005
NA HISTÓRIA NEM TUDO SE REPETE
José Cândido Póvoa* (jcpovoa@hotmail.com)
Contavam meus antepassados que nos idos de 1900, meu avô paterno, Benedito Pinto de Cerqueira Póvoa, assassinado covardemente no tronco (leiam os livros o Tronco, de Bernardo Elis ou Quinta Feira Sangrenta de Osvaldo Póvoa), mantinha um intenso comércio com o Estado da Bahia, mais precisamente com a cidade de Barreiras, negociando boiadas e trazendo gêneros de primeira necessidade e outros apetrechos, entre eles o delicioso vinho do porto em barris de dezoito litros, que originário de Portugal era adquirido em Salvador e de lá por navegação fluvial, através do Rio São Francisco depois Rio Grande, chegava em Barreiras. Raro era o final de semana que os amigos e parentes do meu avô não se deslocavam para a fazenda Prazeres, distante cerca de seis quilômetros da cidade, para um bom bate papo, regado pelo delicioso néctar das videiras portuguesas. Com a morte dos nove homens no massacre do tronco, a história interrompeu-se. As famílias sofridas e desagregadas partiram para locais diferentes em busca de paz. Passaram-se os anos e com o retorno de muitos filhos da terra, o comércio com a cidade baiana reacendeu-se. Das gerações mais próximas, lembro-me dos irmãos Póvoa: Benedito, Liberato e Pery, este último meu pai, fazendo transações com os Bragas, detentores de grande armazém naquela cidade baiana. E mais recentemente, os irmãos Zeca Póvoa e Ditinho, também assim o faziam, através da pessoa de sua confiança, Péricles Póvoa e de muitos outros. Com o advento da criação de Brasília, o eixo de negócios de lá se desviou para outras cidades do Sudeste e Sul, a exemplo de Goiânia, São Paulo e Belo Horizonte, mesmo porque a situação das estradas para a Bahia não era das melhores. E aquele Estado passou a ficar um pouco de lado. Para lá não mais deslocavam-se os filhos de Dianópolis em busca de estudos. Os negócios foram quase que totalmente interrompidos. Acontece a criação do Estado do Tocantins, cumprindo um secular desejo de redenção do norte de Goiás. O progresso se apressou em chegar com mais escolas, hospitais e muito mais tecnologia. Era a integração do antigo corredor do esquecimento com o resto do mundo. E dentre esses benefícios, um dos principais, as estradas asfaltadas, oferecendo opções para um povo antes abandonado. Vejo, agora, carretas e mais carretas resgatando essa ligação com o Estado vizinho. E fico feliz em saber que muito em breve, principalmente pela implantação do projeto de fruticultura entre Dianópolis e Porto Alegre, abrir-se-ão novos horizontes para a Região Sudeste, pois aquele empreendimento estabelecerá o marco do antes e depois do seu início. Tenho plena certeza de que o intercâmbio comercial e cultural será reativado, mas, ao mesmo tempo desaponto-me em saber que os tempos mudaram, pois a sociedade contemporânea enclausurada no egoísmo do ter mais, ou sobre um pedestal de falsa e passageira glória, não nos permite aquele bate papo desinteressado e amigo, regado a um bom vinho do Porto. Tudo isso comprovando que na história nem tudo se repete.
*José Cândido Póvoa – Advogado e poeta –