O FILHO DA CASA DOS PÁSSAROS
quem teria tempo de estender as mãos
e tocar o pulso destes versos
e fitar o rosto destes versos
e com uma fração qualquer de sinceridade
dizer apenas: nada posso fazer meu filho
se todas as brochuras te esperam
para matar-te de silêncio!
quem teria tempo de entender
a família destes versos
a labuta triste destes versos
a humildade rude deste menino
que foi brincar de ser um pássaro
e se perdeu nas mãos dos homens
como uma pedra que não cansa
de chorar o seu retorno!
quem pousaria os olhos nesta dor
que vem dos olhos simples destes versos
que vem da clave muda destes versos
para entender o reino deste menino
primo da música e das abelhas
filho do tempo e do etéreo
filho das coisas que em silêncio
canta para ser eterno!
quem roubaria uma só palavra
de seus olhos, de sua boca
para a velhice destes versos
e no funeral deste menino
inscreve apenas:
Aqui jaz os restos mortais
das coisas simples
deixou como parentes: as flores,
as formigas e as fontes
residia no colo dos coqueiros
era filho da casa dos pássaros.
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INTIMUS
Teria sim,
que dos olhos fosse a última visagem
este creme de luz no pelo de meu corpo
como um anúncio de arco-iris
embalsamando-me de vida
para que eu retornasse dos canteiros:
árvore florescendo pássaros
flores procriando fontes
depois, no dedal de inesperada estrela
compusesse o último verso
que me retornasse a surpresa lenta
de que nada tivesse inventado.
Teria sim,
que de tua boca
apenas o silêncio ficasse solto
como este desespero em teus cabelos
esta página que me inaugurasse
largando esta risada na cara
da minha vida.
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